UM BRASILEIRO.
Patrono das Comunicações no Brasil, a partir de 1889 integrou a Comissão Construtora de Linhas Telegráficas, com o objetivo de estendê-las entre o Rio e Cuiabá, passando por Uberaba e Goiás. Em 1899, chefiou a comissão destinada a estender as linhas telegráficas até Corumbá e às fronteiras com a Bolívia e o Paraguai. Em abril de 1891, foram inauguradas as novas estações telegráficas e em maio a comissão dava por findo seus trabalhos com 1.574 km de linhas instaladas.
Em 1906, recebeu ordem do presidente Afonso Pena, de ligar Cuiabá ao território do Acre, que fora recentemente incorporado ao país, para fechar o circuito telegráfico nacional.
Até 1917, a Comissão Rondon havia construído 2.270km de linhas telegráficas, no Mato Grosso mais de quatro mil e quinhentos quilômetros, instalado 28 estações que deram origem a povoados, realizado o levantamento geográfico de cinquenta mil km lineares de terras e de águas, determinado duzentas coordenadas geográficas e incluído doze rios no mapa do Brasil e corrigido o curso de vários outros.
Em 1919, já general de brigada, nomeado diretor de Engenharia do Exército, autorizou a construção de quarteis. Em 1927, concluiu a ligação telegráfica da Amazônia com o Rio de Janeiro e trabalhou na inspeção das fronteiras, por ordem ministerial.
Primeiro ambientalista e primeiro a respeitar os povos indígenas, antropólogo, pacifista, indigenista, etnólogo, linguista, engenheiro, sertanista, explorador dos trópicos, idealista, com façanhas inacreditáveis, um pequeno grande homem, brasileiro, descendente de índios, recatado e bravo, de enormes realizações, nascido há 156 anos, em 1865, em Mimoso, hoje Santo Antônio do Leverger, no Estado do Mato Grosso, neste mesmo 05 de maio, Cândido Mariano da Silva.
Em gratidão ao tio que o criou, obteve autorização para acrescentar o nome Rondon ao original, de seu pai, Cândido Mariano da Silva, que morreu sem conhecer o filho, e mãe Claudina Lucas Evangelista, neta de índios bororos. Homenagem maior não poderia ter sido, pois passou à posteridade com este nome que lhe fora incorporado, Rondon.
Em 1910, fomentou a criação do SPILTN – Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais, integrante do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, órgão público criado com o objetivo de prestar assistência à população indígena do Brasil, para quem criou o mote “morrer se preciso for, matar nunca”, o organizou e foi seu primeiro diretor.
Fiel ao seu lema, flechado pelo povo indígena nhambiquara, proibiu a reação de seus soldados. E quando, em outras ocasiões, homens foram flechados e morreram, no boletim da comissão louvava o falecido por ter aderido até o fim à filosofia de não violência; mesmo questionado por alguns militares.
Fez pesquisas sobre os povos indígenas, estabeleceu contato pacífico, lutou para que eles pudessem ter posse da sua terra tradicional. Combateu as forças econômicas e sociais que entravam ilegalmente nesse mundo, a partir da sua filosofia fundamental, de que o índio tem o direito de escolher o grau de acercamento que quer ou não com a sociedade brasileira. Afastar-se ou se integrar, deveria ser uma decisão soberana de cada povo indígena, no sentido de que o Estado não mandaria, apenas reconheceria a independência dos primeiros brasileiros.
Em 1913, o ex-presidente Roosevelt aceitou o convite do Brasil e da Argentina de vir à América do Sul realizar conferências e decidiu também que iria conhecer o Amazonas. Pensou uma expedição científica cuja finalidade seria estudar a fauna daquela região e recolher exemplares para o acervo do Museu de História Natural de Nova York. E, no Brasil, o então Coronel do Exército, Candido Rondon, foi designado para acompanhar a expedição, posto que há 20 anos já explorava a região.
Em 26 de abril de 1914, o grupo de 19 homens chegou à confluência de dois rios no coração da selva amazônica, após meses de uma sucessão de dificuldades e privações para realizar um feito notável: navegar e mapear um rio ainda desconhecido, chamado rio da Dúvida, porque seu curso e comprimento eram um mistério; que nomeado, passou a ser o Rio Roosevelt.
Foi o primeiro a gravar músicas no campo indígena, com a colaboração do seu assistente Roquete Pinto. E o primeiro a filmar os ritos e o cotidiano desses povos, exibidos em 1915. E no âmbito acadêmico, não parece ser por acaso que Levis Strauss visitou na década de 1930 as mesmas aldeias que Rondon visitara 20 anos antes.
Fez mais de 20 expedições extensas, com muitos quilômetros viajados, durante sua longa carreira militar (1890 a 1930), uma vida épica, com grandes perigos, grandes desafios e grandes sacríficos. Rondon está entre os cinco exploradores do mundo que recebeu a Medalha Clube dos Exploradores e concomitantemente o título de membro honorário do Clube dos Exploradores de Nova York.
Recebeu 3 indicações ao Prêmio Nobel da Paz. Em 1925, a de Albert Einstein, que em seu diário conta que em todos os âmbitos no Brasil, havia sempre referências a Rondon, inclusive nas sociedades científicas do país. E ouviu Roquete Pinto, falar da sua obra no campo, dos objetos e ferramentas que doou para o Museu Nacional, bem como assistiu os filmes que a Comissão Rondon fizera.
Um homem reto, abnegado, idôneo, estadista, patriota verdadeiro, sacrificava-se muito pelo bem-estar do Brasil. Tinha valores claros: a tolerância, o humanismo e o respeito ao meio ambiente. E ajudou a construir o país moderno, fisicamente com suas estações e linhas telegráficas, colônias, pontes e estradas, e, no sentido simbólico, como construtor de instituições, principalmente programas de proteção aos índios, sendo o Parque Nacional do Xingu projeto de sua concepção.
Rondon empresta seu nome a ruas, aeroporto, museus, cidades e até a um estado, Rondônia, mas apesar disso e de ter referências nos manuais de história, ainda precisa ser mais bem conhecido em suas múltiplas facetas.
A preocupação com a conservação do meio ambiente, o respeito pelos conhecimentos de ordem teórica e prática que os índios cultivavam no trato e no aproveitamento dos bens presentes na natureza e a ânsia de ver uma nação mais justa e igualitária do ponto de vista social, infelizmente parece ter se perdido no tempo, apesar do modernismo de suas percepções.
E passados 63 anos, 03 meses e 16 dias de seu falecimento, em 19 de janeiro de 1958, nesta cidade do Rio de Janeiro, parece fundamental buscar inspiração no seu vigor, na sua resistência e em muitos de seus incríveis feitos como explorador, que lamentavelmente permanecem pouco conhecidos, para resgatar valores fundamentais à sociedade brasileira, como os que defendeu esse enorme brasileiro, “Civilizador dos Sertões”.
Rio de Janeiro, 05 de maio de 2021
Texto adaptado por Paulo Sergio de Almeida Galvão a partir das seguintes fontes:
Expedição científica Roosevelt-Rondon. Sérgio Luiz Augusto de Andrade de Almeida;
Marechal Rondon – Militar brasileiro. Dilva Frazão. e-biografia.
Marechal Rondon. Domingo Alzugaray;
Projeto Três Momentos da História das Telecomunicações no Brasil. Ethevaldo Siqueira. 1998.
Rondon. Uma biografia. De Larry Rohter / Ed. Objetiva;
Rondon, Candido Mariano da Silva. Darcy Ribeiro
―A obra indigenista de Rondon ― 1958; Cadernos de Cultura, do MEC.
― Os quatro princípios de Rondon ― 1958;
Rondon – Inventários do Brasil – 1900 – 1930. 2007
Deixe uma resposta
Want to join the discussion?Feel free to contribute!