Do telefone ao 5G: a história da regulamentação das telecomunicações no Brasil

A história das telecomunicações no Brasil não pode ser compreendida sem considerar o arcabouço regulamentar que acompanhou e, muitas vezes, antecedeu os avanços tecnológicos. Convém destacar que as telecomunicações são regulamentadas pelo Sistema CONFEA CREA há mais de sete décadas. A primeira norma federal a tratar do tema foi a Resolução CONFEA nº 78, de 18 de agosto de 1952, que já estabelecia a competência dos engenheiros eletricistas, dos engenheiros mecânicos-eletricistas e dos então denominados engenheiros de telecomunicações para atuar em telefonia, telegrafia, radiocomunicação, transmissão de sinais e redes técnicas de comunicação, muito antes da promulgação da Lei Federal nº 5.194. Essa resolução foi ainda mais longe ao definir, em seu artigo 3º, que constitui serviço de telecomunicação qualquer emissão, transmissão e recepção de sinais, imagens ou sons de qualquer natureza, usando princípios elétricos, sônicos, óticos ou outros quaisquer, através de qualquer meio. É importante destacar que a engenharia, por meio do CONFEA, foi pioneira na regulamentação do serviço de telecomunicações no Brasil, tendo estabelecido esse conceito técnico quarenta e quatro anos antes da definição jurídica adotada pela Lei Geral de Telecomunicações.

Somente em 16 de julho de 1997, quarenta e quatro anos depois da Resolução CONFEA nº 78 de 1952, com a promulgação da Lei nº 9.472, conhecida como Lei Geral de Telecomunicações, o país incorporou no seu artigo 60 a definição de serviço de telecomunicações para fins de regulação das empresas prestadoras de serviços de telecomunicações. Isso ocorre porque o CONFEA regulamenta o exercício profissional da engenharia, estabelecendo competências e atribuições dos profissionais habilitados, mas não exerce competência sobre a regulação das empresas prestadoras de serviços de telecomunicações. A regulação empresarial, incluindo autorizações, outorgas, fiscalização de redes e organização do setor, é de responsabilidade da ANATEL, criada justamente pela Lei Geral de Telecomunicações. No âmbito do Sistema CONFEA/CREA, a única sanção aplicável às empresas é a multa, uma vez que as penalidades de advertência reservada, censura pública, suspensão e cancelamento de registro previstas no artigo 71 da Lei nº 5.194, de 24 de dezembro de 1966, destinam-se exclusivamente aos profissionais.

O grande marco legal das atribuições profissionais ocorreu em 24 de dezembro de 1966, quando a Lei nº 5.194 incorporou definitivamente as telecomunicações como atividades características da engenharia. Seus artigos 1º, alínea b, 7º e 27, alínea f, estabeleceram que compete aos engenheiros o estudo, o projeto, a direção, a execução e a operação de sistemas de telecomunicações. Desde então, o ordenamento jurídico brasileiro reconhece formalmente, por meio de lei federal, que as telecomunicações constituem um campo próprio da engenharia, reforçando a responsabilidade técnica e a necessidade de formação especializada para o exercício das atividades.

Esse processo de consolidação avançou com a Resolução CONFEA nº 218, de 1973, que sistematizou as atribuições profissionais e confirmou que a transmissão de sinais, a comutação, as redes de telecomunicações, os sistemas de comunicação e toda a infraestrutura técnica associada são atribuições do engenheiro eletricista, do engenheiro eletrônico e do então denominado engenheiro de comunicações, consolidando de forma clara o campo técnico das telecomunicações dentro das modalidades da engenharia.

O Sistema CONFEA CREA continuou a evoluir diante da convergência tecnológica entre eletrônica, computação e telecomunicações. Em 1993, a Resolução CONFEA nº 380 reconheceu novas modalidades vinculadas ao avanço das telecomunicações, impulsionadas pela convergência entre a informática e os sistemas de comunicação. Estabeleceu a competência do engenheiro de computação e do engenheiro eletricista com ênfase em computação, atribuindo-lhes as competências previstas no artigo 7º da Lei nº 5.194 de 1966 combinadas com as atividades 01 a 18 do artigo 1º da Resolução nº 218 de 1973. Incluem-se nesse rol a análise de sistemas computacionais, materiais elétricos e eletrônicos, equipamentos eletrônicos, sistemas de comunicação e telecomunicações, sistemas de medição e controle elétrico e eletrônico e serviços afins e correlatos.

A Resolução CONFEA nº 380, de 1993, atribuiu competências aos engenheiros de computação em razão do avanço da convergência tecnológica entre computação e telecomunicações. À época, essas atribuições foram estabelecidas em caráter provisório, pois o CONFEA buscava disciplinar de forma transitória o exercício profissional enquanto estruturava uma regulamentação definitiva para as novas modalidades tecnológicas emergentes. Esse processo foi consolidado com a Resolução CONFEA nº 1.156, de 2025, que formalizou de maneira definitiva as atribuições do engenheiro de computação, do engenheiro computacional e do engenheiro de computação e informação, sistematizando suas competências com base no artigo 7º da Lei nº 5.194, de 1966, e harmonizando-as com as atividades relacionadas a sistemas de comunicação e telecomunicações previstas na normatização vigente.

No cenário contemporâneo, a Resolução CONFEA nº 1.156, de 2025, também regulamentou e consolidou as atribuições dos profissionais do grupo engenharia da modalidade eletricista. Essa resolução atualizou e reafirmou, em seus artigos 3º e 4º, a competência do engenheiro eletrônico, do engenheiro eletricista com ênfase em eletrônica, do engenheiro de comunicação, do engenheiro em eletrônica, do engenheiro de telecomunicações, do engenheiro em eletrônica e telecomunicações, do engenheiro de computação, do engenheiro computacional e do engenheiro de computação e informação, garantindo a esses profissionais as atribuições previstas no artigo 7º da Lei nº 5.194, de 24 de dezembro de 1966, combinadas com as atividades 01 a 18 do artigo 5º, parágrafo 1º, da Resolução nº 1.073, de 19 de abril de 2016, referentes a sistemas de comunicação e telecomunicações.

Esses marcos da regulação profissional dialogam diretamente com a evolução da regulação dos serviços. A Lei Geral de Telecomunicações, ao criar a ANATEL em 1997, estruturou o modelo regulatório moderno ao organizar o setor, gerenciar o espectro radioeletrônico, fiscalizar redes e disciplinar serviços como o Serviço Telefônico Fixo Comutado, o Serviço Móvel Pessoal e o Serviço de Comunicação Multimídia. Esse arcabouço permitiu a expansão das redes digitais, a consolidação das tecnologias GSM, 3G e 4G e criou as condições regulatórias para o avanço ao 5G.

A estrutura regulatória dos serviços de telecomunicações passou por uma atualização profunda em 28 de abril de 2025, quando a ANATEL aprovou a Resolução nº 777. Esse novo normativo unificou em uma única resolução todos os serviços de telecomunicações, substituindo e revogando integralmente regulamentos anteriores, incluindo a Resolução nº 477 de 2007 do Serviço Móvel Pessoal, a Resolução nº 426 de 2005 do Serviço Telefônico Fixo Comutado e a Resolução nº 614 de 2013 do Serviço de Comunicação Multimídia. Ao consolidar a regulamentação em um único marco normativo, a ANATEL modernizou e harmonizou as regras aplicáveis aos serviços, eliminando sobreposições e estabelecendo um conjunto único de diretrizes compatíveis com a convergência tecnológica das redes IP, fibra óptica, 4G, 5G e demais evoluções digitais.

A chegada do 5G inaugurou uma nova etapa da transformação digital, exigindo normas rigorosas sobre espectro, antenas, redes ópticas, mitigação de interferências, certificação de equipamentos e segurança cibernética. Ao mesmo tempo, reforçou-se a importância da dualidade regulatória. O Sistema CONFEA CREA regula o exercício profissional e assegura a responsabilidade técnica, enquanto a ANATEL regula a prestação dos serviços, a infraestrutura e o uso do espectro. Essa dupla estrutura garante que redes de alta complexidade sejam projetadas, implantadas e operadas com rigor técnico, segurança e qualidade.

Assim, a passagem do telefone analógico à ultraconectividade do 5G demonstra que, sempre que o Brasil avançou tecnologicamente, a engenharia e a regulação caminharam juntas. A evolução das normas do Sistema CONFEA CREA e o amadurecimento regulatório da ANATEL formam um conjunto que assegura segurança técnica, eficiência, inovação e proteção ao usuário, preparando o país para os desafios das próximas gerações de comunicação digital.

Autor

Eng. Eletric. Rogério Moreira Lima
Diretor de Inovação da ABTELECOM
Diretor Estadual MA da ABTELECOM
Especialista da ABEE Nacional
Coordenador da CAPA e CEALOS do CREA-MA
Diretor de Relações Institucionais e Membro Titular da Cadeira nº 54 da Academia Maranhense de Ciências
1º Secretário da ABEE-MA
Professor do PECS/UEMA
Membro da ABRACOPEL e do SENGE-MA

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Engenharia de Computação e Telecomunicações: A Convergência que Impulsiona a Transformação Digital

 

A engenharia foi regulamentada no Brasil em 11 de dezembro de 1933, data em que também foram criados o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (CONFEA) e os Conselhos Regionais de Engenharia e Agronomia (CREAs), instituindo o sistema de fiscalização profissional das atividades técnicas de engenharia, agronomia e demais profissões correlatas. Em 18 de agosto de 1952, dezoito anos e oito meses após a regulamentação da engenharia, o CONFEA reconheceu oficialmente o exercício, por profissionais de grau superior, da especialidade de telecomunicação, por meio da Resolução CONFEA nº 78/1952. Essa norma foi pioneira ao estabelecer o escopo das atribuições dos engenheiros eletricistas e mecânicos-eletricistas, fixando como competências o estudo, projeto, direção, fiscalização e montagem de estações de telecomunicações sem fios, o estudo e projeto das redes de telecomunicação sem fios, o estudo, projeto, direção, fiscalização e montagem das estações de telecomunicação com fios, e o estudo, projeto, direção, fiscalização e instalação das redes de telecomunicação com fios. O artigo 2º da resolução dispôs que as atribuições dos engenheiros em telecomunicação, diplomados por escolas oficiais ou reconhecidas pelo Governo, seriam idênticas às mencionadas no artigo 1º, acrescidas daquelas previstas em seus currículos. Já o artigo 3º apresentou uma definição notavelmente moderna para a época, conceituando serviço de telecomunicação como “qualquer emissão, transmissão e recepção de sinais, imagens ou sons de qualquer natureza, usando princípios elétricos, sônicos, óticos ou outros quaisquer, através de qualquer meio”.

Ressalta-se que as telecomunicações foram incorporadas como atividade característica da engenharia em 24 de dezembro de 1966, com a promulgação da Lei nº 5.194/1966, em especial pelos arts. 1º, alínea “b”, e 7º, que estabeleceram as bases legais para o exercício das profissões de engenheiro e engenheiro-agrônomo, definindo as atividades técnicas próprias da engenharia e as atribuições privativas desses profissionais. Em 29 de junho de 1973, o CONFEA editou a Resolução nº 218/1973, que organizou e sistematizou as modalidades profissionais da engenharia e da agronomia, estabelecendo no artigo 9º que compete ao engenheiro eletrônico, ao engenheiro eletricista, modalidade eletrônica, ou ao engenheiro de comunicação o desempenho das atividades profissionais referentes a materiais elétricos e eletrônicos, equipamentos eletrônicos em geral, sistemas de comunicação e telecomunicações, sistemas de medição e controle elétrico e eletrônico e seus serviços afins e correlatos. Essa resolução manteve a regulamentação das telecomunicações no âmbito da engenharia elétrica, consolidando o enquadramento técnico e profissional das atividades ligadas à transmissão, emissão e recepção de sinais como campo próprio dos engenheiros eletricistas, eletrônicos e de comunicação, conforme previsto na Lei nº 5.194/1966. A Resolução CONFEA nº 218/1973 também revogou expressamente a Resolução CONFEA nº 78/1952, atualizando e ampliando o enquadramento das atribuições profissionais à luz das novas realidades tecnológicas e acadêmicas da engenharia brasileira.

Em 1993, a Resolução CONFEA nº 380/1993 definiu que as telecomunicações também constituíam atribuições específicas do engenheiro de computação, acompanhando a evolução tecnológica e o surgimento das redes digitais. No entanto, essa resolução teve caráter provisório, atribuindo aos engenheiros de computação competências transitórias, uma vez que os cursos dessa modalidade ainda se encontravam em consolidação e careciam de diretrizes curriculares nacionais que delimitassem com precisão seus campos de atuação. Assim, o engenheiro de computação permaneceu por mais de três décadas com atribuições provisórias, até que, em 2025, o CONFEA consolidou definitivamente sua regulamentação profissional.

A Resolução CONFEA nº 1.156/2025 regulamentou, de forma definitiva, que compete ao engenheiro de computação, ou ao engenheiro computacional, ou ao engenheiro de computação e informação, ou ao engenheiro eletricista com ênfase em computação, as atribuições previstas no artigo 7º da Lei nº 5.194/1966, combinadas com as atividades 01 a 18 do artigo 5º, §1º, da Resolução CONFEA nº 1.073/2016, referentes à análise de sistemas computacionais, materiais elétricos e eletrônicos, equipamentos eletrônicos em geral, sistemas de comunicação e telecomunicações, sistemas de medição e controle elétrico e eletrônico e seus serviços afins e correlatos. Assim, a nova resolução consolidou de forma definitiva as atividades técnicas em telecomunicações como de competência também dos engenheiros de computação, assegurando a integração plena dessa modalidade no conjunto das engenharias da modalidade eletricista.

Cumpre registrar que a Resolução CONFEA nº 1.156, de 24 de outubro de 2025, também promoveu a consolidação normativa da modalidade eletricista ao revogar expressamente os dispositivos e resoluções anteriores que tratavam das atribuições profissionais de forma fragmentada. Foram revogados os arts. 8º e 9º da Resolução nº 218, de 30 de junho de 1973; a Resolução nº 380, de 17 de dezembro de 1993; a Resolução nº 427, de 5 de março de 1999; a Resolução nº 1.076, de 5 de julho de 2016; a Resolução nº 1.100, de 24 de maio de 2018; a Resolução nº 1.103, de 26 de julho de 2018; e os arts. 3º, 11, 12, 13 e 14 da Resolução nº 1.129, de 11 de dezembro de 2020. Essas revogações representaram a unificação do conjunto normativo que tratava das atribuições de todos os engenheiros do grupo engenharia modalidade eletricista, resultando em um instrumento único, coerente com a evolução tecnológica e com as diretrizes curriculares da engenharia contemporânea.

Com o avanço tecnológico das telecomunicações e a necessidade de um marco regulatório unificado, foi instituída em 16 de julho de 1997 a Lei nº 9.472, conhecida como Lei Geral de Telecomunicações (LGT), que criou a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), autarquia especial responsável por regular, fiscalizar e desenvolver o setor de telecomunicações no Brasil. O artigo 60 da Lei nº 9.472/1997 define expressamente que o serviço de telecomunicação envolve a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza. Essa redação, que permanece em vigor, tornou-se a base conceitual do ordenamento jurídico brasileiro sobre o tema, consagrando e reafirmando o entendimento técnico-científico já consolidado no Sistema CONFEA/CREA desde 1952 e reforçando a natureza essencialmente eletromagnética da comunicação moderna.
Quando se trata da natureza eletromagnética das telecomunicações, é importante compreender que todo o processo de emissão, transmissão e recepção de sinais ocorre por meio de ondas eletromagnéticas. São exemplos de sistemas e meios de transmissão baseados nesse princípio o rádio, o 5G, o cabo coaxial e a fibra óptica, entre outros. Enquanto o rádio e o 5G utilizam o espectro de radiofrequências, o cabo coaxial e a fibra óptica propagam os sinais eletromagnéticos em meios físicos, sendo que, atualmente, as operadoras de TV a Cabo vêm migrando de redes HFC (híbridas de fibra óptica e cabo coaxial) para redes GPON (Gigabit Passive Optical Network), que utilizam fibra óptica até a última milha, garantindo maior capacidade e eficiência na transmissão de dados.
Essa definição é muito semelhante àquela adotada mais de quatro décadas antes pelo art. 3º da Resolução CONFEA nº 78/1952, que conceituava o serviço de telecomunicação como “qualquer emissão, transmissão e recepção de sinais, imagens ou sons de qualquer natureza, usando princípios elétricos, sônicos, óticos ou outros quaisquer, através de qualquer meio”. Tal semelhança demonstra a consistência e a continuidade do entendimento técnico das telecomunicações como atividade da engenharia.

A fronteira entre a ciência da computação e as telecomunicações deixou de ser um limite definido para se tornar um ponto de convergência tecnológica, consolidando o surgimento de um novo profissional: o engenheiro de computação. As comunicações modernas são essencialmente digitais, e os sistemas computacionais tornaram-se o núcleo de armazenamento, controle e processamento da informação. Essa integração entre hardware, software e redes de telecomunicações sustenta a infraestrutura da transformação digital e redefine os contornos da inovação no século XXI. A engenharia de computação, ao integrar fundamentos de eletrônica, automação, ciência da computação e telecomunicações, forma o profissional capaz de projetar desde dispositivos embarcados até sistemas distribuídos e infraestruturas em nuvem.

Por sua vez, as telecomunicações passaram por um processo de profunda transformação tecnológica. As antigas redes analógicas de voz, baseadas em comutação de circuitos, evoluíram para redes digitais hierarquizadas, inicialmente estruturadas sobre as tecnologias PDH (Plesiochronous Digital Hierarchy) e SDH (Synchronous Digital Hierarchy), que permitiram a multiplexação e o transporte de grandes volumes de dados com precisão temporal. Posteriormente, surgiram as redes de pacotes com o uso de Frame Relay e ATM (Asynchronous Transfer Mode), que introduziram o conceito de virtualização de canais e possibilitaram maior eficiência na comutação e no uso da largura de banda. Essa digitalização das redes culminou nas chamadas Redes de Nova Geração (NGN – Next Generation Networks), nas quais os serviços de voz, dados e vídeo convergem sobre uma única infraestrutura baseada em IP, utilizando protocolos como SIP (Session Initiation Protocol) e tecnologias de SIP Trunking, que substituíram os troncos analógicos e E1 tradicionais por enlaces digitais flexíveis e escaláveis. Atualmente, as telecomunicações avançam para redes inteligentes e programáveis sustentadas por SDN (Software Defined Networks) e NFV (Network Function Virtualization), que se apoiam em ambientes virtualizados e orientados por software, exigindo domínio de programação, processamento digital de sinais, redes IP e computação em nuvem.

Com a chegada do 5G, da Internet das Coisas (IoT) e da inteligência artificial embarcada, a interdependência entre essas duas áreas tornou-se ainda mais evidente. A arquitetura das redes de quinta geração, por exemplo, é profundamente dependente de funções virtualizadas e orquestradas em datacenters, onde algoritmos de aprendizado de máquina otimizam a alocação de recursos e o roteamento inteligente do tráfego. Nesse contexto, a engenharia de computação fornece as ferramentas de software, de hardware e também as redes de telecomunicações que garantem a robustez física, a confiabilidade e a segurança da infraestrutura.

Mais do que uma soma de competências, a integração entre computação e telecomunicações representa o coração das infraestruturas digitais contemporâneas, que incluem redes, datacenters, nuvem e sistemas embarcados. O engenheiro desse novo paradigma é o engenheiro de computação, mediador entre a energia elétrica que alimenta os bits, as telecomunicações responsáveis pela comunicação de dados e o código que transforma dados em conhecimento, desempenhando papel essencial na construção de um Brasil mais conectado, inovador e independente tecnologicamente.

Autor:
Eng. Eletric. Rogério Moreira Lima
Diretor de Inovação da ABTELECOM
Diretor Estadual MA da ABTELECOM
Especialista da ABEE Nacional
Coordenador da CAPA e CEALOS do CREA-MA
Diretor de Relações Institucionais e Membro Titular da Cadeira nº 54 da Academia Maranhense de Ciências
1º Secretário da ABEE-MA
Professor do PECS/UEMA
Membro da ABRACOPEL e do SENGE-MA

Regularização dos Serviços de Telecomunicações: ANATEL e Sistema CONFEA/CREA impulsionam Inovação com Segurança e Não Ruptura

Por Eng. Eletric. Rogerio Moreira Lima Silva
Diretor de Inovação e Estadual MA da ABTELECOM, Especialista da ABEE Nacional, Coordenador da CAPA e CEALOS do CREA-MA, 1º Secretário da ABEE-MA, Professor da UEMA e Diretor de Relações Institucionais da Academia Maranhense de Ciências

A manchete publicada pelo portal Olhar Digital, intitulada “ANATEL: milhares de provedoras de internet fixa se tornam clandestinas hoje”, gerou apreensão entre as Prestadoras de Pequeno Porte (PPPs), fundamentais para a interiorização da conectividade e a inclusão digital no país. No entanto, uma leitura técnica e regulatória mais cuidadosa revela um cenário oposto. A Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) não está promovendo uma ruptura, mas conduzindo um processo responsável de regularização e fortalecimento institucional, orientado pela segurança, pela transparência e pela valorização da engenharia.

Em 27 de junho de 2025, o Conselho Diretor da ANATEL aprovou a Resolução Interna nº 449/2025, que instituiu o Plano de Ação para o Combate à Concorrência Desleal e para a Regularização da Prestação do Serviço de Comunicação Multimídia (SCM). O documento reconhece o papel essencial das PPPs na expansão da banda larga, inclusive em regiões menos atrativas economicamente, e busca equilibrar a livre concorrência com a segurança jurídica no setor. O plano definiu prazo de 120 dias para que as prestadoras em situação irregular se adequem, priorizando medidas orientativas antes de qualquer ação sancionatória.

Antes dessa resolução, a Agência já havia publicado a Resolução Interna nº 428/2025, em 30 de abril, que estabeleceu o prazo de 180 dias para adequação das empresas às exigências de segurança do trabalho, prevenção de acidentes e regularidade fiscal. Essa sequência evidencia que a ANATEL atua com planejamento e prudência, adotando primeiro medidas educativas e de apoio técnico e, em seguida, mecanismos de regularização e fiscalização.

A política de segurança técnica da Agência foi ampliada em agosto de 2025 com a publicação da Resolução nº 780/2025, que alterou o Regulamento de Avaliação da Conformidade e de Homologação de Produtos para Telecomunicações. Essa norma incluiu o Título VI-A, que trata da avaliação da conformidade e da homologação de data centers que integram as redes de telecomunicações, criando um novo marco regulatório de proteção da infraestrutura crítica digital do país.

Os data centers vinculados a redes de telecomunicações deverão ser avaliados e certificados antes do início de suas operações. O procedimento operacional de certificação será publicado em até 240 dias após a entrada em vigor da norma, e os data centers já em operação terão três anos para se adequar. Entre os requisitos de avaliação estão a segurança física das instalações, a resiliência operacional contínua, a segurança cibernética contra ataques e invasões, a eficiência energética e a sustentabilidade ambiental.

Com essa medida, a ANATEL avança na proteção da soberania digital e da infraestrutura de dados do país, assegurando que apenas data centers certificados possam ser utilizados por prestadoras de telecomunicações. A Resolução nº 780/2025 representa uma evolução natural do processo regulatório, complementando as Resoluções nº 428 e nº 449 e criando uma arquitetura de segurança que abrange o trabalho humano, as redes físicas e os ambientes digitais.

Essa estrutura de governança técnica também dialoga com as ações do Sistema CONFEA/CREA. A Decisão Plenária CONFEA nº 1.744/2021 instituiu a Fiscalização Nacional dos Provedores de Internet com base em proposição da Coordenadoria de Câmaras Especializadas de Engenharia Elétrica (CCEEE). Essa decisão surgiu diante do aumento de acidentes com trabalhadores de provedores de internet, inclusive fatais, em empresas sem registro ou sem responsável técnico. O plenário determinou que os CREAs desenvolvessem ações conjuntas e preventivas, com uso de métodos modernos e inteligentes de fiscalização. A medida foi aprovada por ampla maioria e consolidou uma política nacional de acompanhamento técnico das atividades de telecomunicações, reforçando o papel do Sistema CONFEA/CREA na defesa da sociedade e na prevenção de sinistros.

Essa integração entre ANATEL e CONFEA traduz-se em uma política pública coordenada, na qual a Agência regula e fiscaliza os serviços, enquanto o Sistema CONFEA/CREA garante que as atividades sejam executadas por profissionais habilitados e sob responsabilidade técnica. A soma dessas atuações fortalece o ambiente regulatório e aumenta a segurança das redes e dos trabalhadores.

O Sistema CONFEA/CREA é composto por 28 autarquias federais, sendo o CONFEA o órgão nacional e os 27 CREAs as unidades regionais. Todas possuem autonomia administrativa e financeira e não estão vinculadas a ministérios, o que assegura independência técnica e presença em todo o território brasileiro.

Nas telecomunicações, essa integração é essencial. O Brasil possui uma dupla regulação complementar: a ANATEL, responsável pela prestação dos serviços de telecomunicações conforme a Lei nº 9.472/1997, e o Sistema CONFEA/CREA, que fiscaliza o exercício profissional e a responsabilidade técnica conforme a Lei nº 5.194/1966 e a Lei nº 6.496/1977, que institui a Anotação de Responsabilidade Técnica (ART). Essa atuação coordenada garante segurança jurídica, qualidade técnica e proteção à sociedade.

O planejamento, o estudo, o projeto, a execução e a fiscalização de obras e serviços técnicos de telecomunicações são atividades características da engenharia e de competência dos engenheiros eletricistas, eletrônicos, de telecomunicações e de computação, conforme os artigos 1º, 7º e 27 da Lei nº 5.194/1966, o artigo 9º da Resolução CONFEA nº 218/1973 e o artigo 1º da Resolução CONFEA nº 380/1993. Essas normas sustentam o tripé técnico das telecomunicações: Análise Espectral, Eletromagnetismo e Teoria Estatística das Comunicações.

A Análise Espectral fundamenta-se na Transformada de Fourier, que permite decompor os sinais em suas componentes de frequência e compreender o espectro utilizado na transmissão de dados. Esse princípio é a base tanto das comunicações ópticas quanto das comunicações por rádio e das redes móveis de quinta geração (5G).

Nas redes ópticas, a análise espectral é empregada para definir as janelas de transmissão, que correspondem às faixas de menor atenuação e dispersão, garantindo eficiência e estabilidade na propagação da luz. As três janelas ópticas de maior relevância situam-se ao redor de 850 nm, 1300 nm e 1550 nm, comprimentos de onda que apresentam as menores perdas e o melhor desempenho em longas distâncias. Essas faixas estão na região do infravermelho próximo, onde as fibras ópticas monomodo apresentam mínima dispersão dos pulsos e ampla largura de banda, possibilitando a transmissão de grandes volumes de dados com elevada confiabilidade. Essa eficiência resulta da precisão com que a luz é confinada no núcleo da fibra, cujo índice de refração é ligeiramente superior ao da casca, permitindo o fenômeno da reflexão interna total e garantindo o guiamento da onda eletromagnética com baixíssima degradação do sinal.

Nas comunicações por rádio e nas redes 5G, a análise espectral é igualmente essencial para o uso racional e eficiente do espectro de frequências, recurso escasso e de alto valor estratégico. A título de exemplo, o 5G no Brasil opera principalmente nas faixas de 2,3 GHz, 3,5 GHz e 26 GHz, cada uma destinada a diferentes aplicações: a primeira voltada à cobertura ampla e estável, a segunda ao equilíbrio entre alcance e capacidade, e a terceira, em ondas milimétricas, voltada a altíssimas taxas de transmissão e baixa latência. O domínio da análise espectral permite aplicar técnicas como OFDM (Orthogonal Frequency Division Multiplexing) e MIMO (Multiple Input Multiple Output), que aumentam a eficiência espectral, reduzem interferências e otimizam o desempenho das redes de próxima geração.

O Eletromagnetismo, descrito pelas Equações de Maxwell e de Helmholtz, explica como as ondas eletromagnéticas se propagam e interagem tanto em espaço livre quanto em espaço confinado, sustentando o princípio físico que torna possível tanto o 5G quanto as comunicações ópticas. Essa precisão física e matemática é o que permite à engenharia de telecomunicações controlar parâmetros como dispersão, atenuação e largura de banda, garantindo a segurança, a estabilidade e a confiabilidade dos enlaces ópticos modernos, seja via rádio seja por fibra óptica.

A Teoria Estatística das Comunicações, baseada em processos estocásticos, descreve o comportamento aleatório dos sinais e do ruído, permitindo quantificar a confiabilidade e a capacidade de transmissão de um canal. Essa teoria também possibilita avaliar os efeitos de multipercurso e seletividade, determinando as faixas em que o canal apresenta desvanecimento plano (flat fading), condição em que todas as frequências sofrem atenuação semelhante.

De acordo com o Anuário Estatístico de Acidentes de Origem Elétrica 2025, elaborado pela ABRACOPEL, as medidas implementadas já apresentam resultados expressivos. As mortes de trabalhadores de telecomunicações caíram 52% em 2024 em relação a 2023, resultado direto da intensificação da fiscalização e da exigência de conformidade técnica. Ainda assim, o número permanece 200% acima do registrado em 2015, mantendo o setor entre as cinco atividades com mais mortes por choque elétrico no país.

Outro ponto de preocupação é a infiltração do crime organizado no setor de provedores de internet, especialmente nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro e de Fortaleza, onde milícias e facções criminosas exploram redes clandestinas. Essa prática ameaça a segurança pública, fragiliza as infraestruturas e distorce o ambiente competitivo.

O enfrentamento à clandestinidade técnica, à criminalidade econômica e às vulnerabilidades digitais é uma necessidade urgente e coletiva. Esses fenômenos colocam em risco a confiabilidade das redes, a segurança dos profissionais e a proteção dos dados.

As ações coordenadas da ANATEL e do Sistema CONFEA/CREA representam um avanço efetivo nesse cenário. Enquanto a ANATEL fortalece a regulação e promove transparência, o Sistema CONFEA/CREA assegura que as atividades técnicas sejam conduzidas por profissionais legalmente habilitados e comprometidos com a segurança.

A convergência dessas autarquias federais traduz-se em mais proteção à sociedade, redução de riscos operacionais e fortalecimento da infraestrutura digital brasileira. Regularizar é preservar vidas, garantir o funcionamento seguro das redes e promover a inovação com responsabilidade.

Em um país cada vez mais dependente de suas infraestruturas críticas, a segurança física, técnica, operacional e cibernética forma o novo quadrante de sustentação das telecomunicações. A consolidação dessa governança técnica é o que permitirá ao Brasil avançar com inovação, estabilidade e soberania digital.

Entre Maxwell, Cooper e as fake news: a verdade científica sobre o 5G e as abelhas

Das equações de Maxwell ao primeiro celular de Cooper, a trajetória das telecomunicações é marcada por avanços científicos sólidos. Mesmo assim, persistem mitos sobre o 5G e seus supostos efeitos biológicos. A ciência e a regulação mostram outra realidade.

Circulam nas redes sociais boatos de que o 5G faria abelhas abandonarem colmeias. A física, a biologia e a engenharia mostram que não há base científica nessa hipótese: a radiação do 5G é não ionizante, fraca e opera dentro de limites seguros definidos por normas internacionais.

A base das telecomunicações começa quando James Clerk Maxwell unificou a eletricidade e o magnetismo, provando que esses fenômenos existem em conjunto. Maxwell avançou em relação aos estudos de André-Marie Ampère, que havia demonstrado que toda carga elétrica em movimento gera um campo magnético, e também ampliou os trabalhos de Michael Faraday e Heinrich Lenz, que haviam comprovado o fenômeno da indução eletromagnética.

Em seu desenvolvimento teórico, Maxwell buscou preservar a coerência entre a equação da continuidade e a Lei de Ampère, introduzindo o conceito de corrente de deslocamento como solução para o equilíbrio entre essas formulações. Essa contribuição permitiu completar o sistema de equações que descreve o comportamento conjunto dos campos elétrico e magnético, unificando-os em uma teoria capaz de explicar tanto os fenômenos estáticos quanto os dinâmicos.

A corrente de deslocamento garante a adequação entre a equação da continuidade e a Lei de Ampère, assegurando a conservação de energia em sistemas eletromagnéticos. Maxwell percebeu que, em um circuito onde o campo elétrico varia no tempo, como no interior de um capacitor durante o carregamento, existe uma região onde não há corrente elétrica conduzida por elétrons, mas o campo elétrico variável gera um efeito equivalente, produzindo linhas de fluxo magnético. Essa correção completou a simetria das equações de Maxwell e permitiu explicar fenômenos oscilatórios e de propagação que até então não eram compreendidos pela física.

A equação de Maxwell conhecida como Lei de Ampère-Maxwell, ao introduzir o conceito de corrente de deslocamento, é a equação fundamental que torna possível a propagação das ondas eletromagnéticas. Sua combinação com a Lei de Faraday-Lenz da Indução Eletromagnética demonstra que campos elétricos e magnéticos variáveis no tempo se regeneram mutuamente e se propagam no espaço, constituindo a base física das telecomunicações e de toda a tecnologia moderna de transmissão de sinais sem fio.

Esse avanço conceitual permitiu compreender matematicamente a propagação das ondas eletromagnéticas, pois as equações de Maxwell são a base da equação de Helmholtz, que descreve como as ondas se propagam no espaço. A comprovação experimental dessa teoria foi realizada posteriormente por Heinrich Hertz, que demonstrou a existência das ondas eletromagnéticas previstas por Maxwell, inaugurando o caminho que levaria à invenção do rádio, da televisão, dos satélites e, por fim, das redes de comunicações móveis modernas.

Mais de um século depois, em 3 de abril de 1973, o Engenheiro Eletricista Martin Cooper, da Motorola, realizou a primeira chamada móvel da história com o DynaTAC 8000X, um telefone de 1,1 kg cuja bateria durava apenas 25 minutos. Formado em Engenharia Elétrica pela Universidade de Illinois e pelo Instituto de Tecnologia de Illinois, Cooper liderou a equipe que transformou o conceito de comunicação pessoal em realidade, inaugurando a era dos telefones celulares e abrindo caminho para a evolução das redes móveis que culminaria no 5G.

Nos últimos dias, circularam nas redes sociais publicações afirmando que a radiação emitida pelas antenas de telefonia 5G estaria fazendo com que abelhas abandonassem suas colmeias. A hipótese, apresentada de forma alarmista e amplamente compartilhada em vídeos e grupos de mensagens, reacende o debate sobre a relação entre tecnologia, meio ambiente e informação. Esse tipo de conteúdo, contudo, precisa ser analisado à luz da ciência, da engenharia e da regulação técnica, e não com base em especulações.

A primeira distinção fundamental é entre radiação ionizante e não ionizante. A radiação ionizante, como a dos raios X e das partículas alfa e beta, possui energia suficiente para alterar a estrutura atômica da matéria, rompendo ligações químicas e provocando efeitos biológicos potencialmente nocivos.

A radiação é considerada ionizante quando possui energia suficiente para remover elétrons de um átomo, formando íons. Esse fenômeno ocorre quando a energia transportada por cada fóton, a partícula elementar associada à radiação eletromagnética, é maior que a energia de ligação do elétron ao núcleo atômico. Em termos físicos, isso significa que a radiação tem força suficiente para quebrar a ligação entre o elétron e o átomo, alterando sua estrutura.

A energia de um fóton depende diretamente da frequência da radiação. Quanto maior a frequência, maior a energia associada. É por isso que radiações como os raios X e os raios gama são classificadas como ionizantes, pois possuem altíssimas frequências e, portanto, energia suficiente para provocar ionização e danos biológicos.

Entretanto, as radiações não ionizantes, entre as quais se enquadram as ondas de rádio, televisão, Wi-Fi e 5G, apresentam frequências muito mais baixas, o que significa que a energia de seus fótons é incomparavelmente menor. Essa energia é incapaz de romper ligações atômicas ou causar ionização, produzindo apenas o efeito térmico, ou seja, um leve aquecimento local quando a energia é absorvida, muito abaixo de qualquer nível prejudicial à saúde.

Além disso, os níveis de potência utilizados nas transmissões 5G são extremamente baixos. Mesmo uma estação rádio-base de cobertura ampla, como a Qualcomm – Plataforma 5G RAN para Small Cells (FSM200xx), que suporta 64 elementos de antena com dupla polarização e é capaz de transmitir potência superior a 40 dBm (classe 1), opera com energia muito pequena quando comparada a outras fontes de radiação do cotidiano. Para efeito de comparação, uma lâmpada incandescente de 60 W irradia cerca de 47,8 dBm, o que representa muito mais energia térmica do que uma antena 5G. Mesmo nas estações macro, a potência típica por setor gira em torno de 30 dBm, valor muito inferior ao de dispositivos elétricos domésticos comuns. Embora 47,8 dBm possa parecer apenas um pouco acima de 40 dBm, é importante lembrar que a escala de decibéis é logarítmica – a cada aumento de 3 dB, a potência dobra – de modo que uma diferença de 7,8 dB entre a lâmpada e a estação 5G representa várias vezes mais energia irradiada em termos absolutos.

Em dispositivos móveis, como smartphones, a potência média é ainda menor, geralmente entre 20 e 23 dBm, o que corresponde a apenas 100 a 200 mW, valores insuficientes para causar qualquer alteração biológica mensurável.

No Brasil, o controle sobre esses limites é rigoroso. A Resolução nº 700, de 28 de setembro de 2018, da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), que estabelece os limites de exposição a campos elétricos, magnéticos e eletromagnéticos na faixa de 8,3 kHz a 300 GHz, está alinhada às diretrizes internacionais da ICNIRP (International Commission on Non-Ionizing Radiation Protection).

A ICNIRP descreve os limiares biológicos que servem de base para a definição dos limites de exposição humana à radiação de radiofrequência. Esses limiares se baseiam em três mecanismos fisiológicos principais: estimulação neural, aumento de temperatura e alterações na permeabilidade das membranas celulares.

O primeiro ocorre apenas em frequências mais baixas, inferiores a 10 MHz, quando os campos elétricos podem induzir correntes dentro do corpo humano e provocar pequenas respostas nos tecidos nervosos e musculares. Em frequências mais elevadas, como as empregadas em telecomunicações, esse efeito deixa de ocorrer e o principal fenômeno associado passa a ser o aquecimento tecidual resultante da absorção de energia eletromagnética.

O segundo é o aumento de temperatura, que constitui o efeito dominante na faixa de radiofrequências utilizada por sistemas de comunicação sem fio. A ICNIRP destaca que a absorção de energia de radiofrequência pode elevar a temperatura dos tecidos, mas apenas em níveis muito superiores aos encontrados em situações reais de exposição. Estudos experimentais demonstram que danos teciduais só ocorrem quando a temperatura local excede entre 41 °C e 43 °C, dependendo do tipo de tecido e da duração da exposição. Para garantir ampla margem de segurança, as diretrizes estabelecem limites que impedem elevações superiores a 2 °C em órgãos internos e 5 °C em tecidos superficiais, como a pele e os membros. Esses valores correspondem a níveis de SAR e densidade de potência muito acima das condições observadas em transmissões 5G, em que o aumento de temperatura é inferior a 1 °C e fisiologicamente insignificante.

O terceiro mecanismo é a alteração na permeabilidade das membranas celulares, observada apenas em exposições pulsadas de altíssima intensidade e curta duração. Essas variações transitórias ocorrem em níveis de energia extremamente elevados, superiores a 5 quilowatts por quilograma (kW/kg), em frequências próximas de 18 gigahertz (GHz), valores centenas de vezes maiores que os limites de segurança adotados. A ICNIRP concluiu que esses efeitos estão diretamente associados ao excesso de energia térmica e que os limites de exposição estabelecidos para controlar o aquecimento já garantem proteção total contra qualquer alteração de membrana celular.

Esses três mecanismos constituem a base científica dos limites internacionais de exposição a radiofrequências e sustentam os parâmetros adotados pela Resolução ANATEL nº 700/2018, assegurando que as redes de telecomunicações, inclusive as tecnologias 5G, operem com ampla margem de segurança em relação aos limiares biológicos de risco.

Essas diretrizes formam a base científica da regulamentação brasileira, garantindo que as redes de comunicações móveis, incluindo o 5G, operem dentro de limites amplamente seguros para seres humanos, fauna e flora. As avaliações de campo realizadas em diversas cidades brasileiras indicam níveis de intensidade eletromagnética muito inferiores aos limites máximos permitidos, evidenciando que o impacto ambiental e biológico é praticamente nulo.

Até o momento, não há evidência científica robusta que associe a operação de estações 5G ao abandono de colmeias ou à desorientação de abelhas. Pesquisas conduzidas dentro de parâmetros reais de exposição indicam que os campos eletromagnéticos típicos das telecomunicações não produzem alterações significativas no comportamento desses insetos.

A expansão das redes de telecomunicações deve sempre observar princípios de sustentabilidade ambiental, responsabilidade técnica e licenciamento pelos órgãos competentes, mas o debate precisa estar fundamentado em dados científicos e não em fake news.

A engenharia, ao seguir normas nacionais e internacionais de segurança, é uma aliada da preservação ambiental e da inovação tecnológica, assegurando que o avanço digital ocorra de forma segura, transparente e sustentável. Combater a desinformação também é uma forma de engenharia, pois significa aplicar o conhecimento técnico em defesa da verdade científica e do interesse coletivo.

Eng. Eletric. Rogerio Moreira Lima Silva, Mestre e Doutor em Engenharia Elétrica/Telecom
Diretor da ABTELECOM | Especialista da ABEE Nacional | 1º Secretário da ABEE-MA | Coordenador da CAPA e da CEALOS do CREA-MA | Diretor de Relações Institucionais da AMC | Membro da ABRACOPEL | Professor da UEMA

Referências Técnicas

ANATEL – Resolução nº 700, de 28 de setembro de 2018. Limites de exposição a campos elétricos, magnéticos e eletromagnéticos na faixa de 8,3 kHz a 300 GHz.

ICNIRP – Guidelines for Limiting Exposure to Electromagnetic Fields (100 kHz to 300 GHz). Health Physics, vol. 118, nº 5, 2020.

ICNIRP – Principles for Non-Ionizing Radiation Protection. Health Physics, vol. 118, nº 5, 2020.

UIT-T – Recomendações K.52, K.61 e K.100 – Orientações para conformidade, medição e previsão numérica de campos eletromagnéticos em instalações de telecomunicações.

QUALCOMM – Plataforma 5G RAN para Small Cells (FSM200xx). Ficha técnica do fabricante, 2023.

MARTIN COOPER (MOTOROLA, 1973) – Desenvolvimento do telefone celular DynaTAC 8000X e primeira chamada móvel realizada em 3 de abril de 1973. Entrevista à AFP (2023).

Internet Quântica: o futuro da conectividade

Por Eng. Eletric. Rogerio Moreira Lima
Diretor de Inovação e Estadual MA da ABTELECOM
Especialista da ABEE Nacional
Coordenador da CAPA e CEALOS do CREA-MA
1° Secretário ABEE-MA
Professor do PECS/UEMA

O artigo “Photon-Interfaced Ten-Qubit Register of Trapped Ions” (Physical Review Letters, 21 de agosto de 2025) apresentou um registro de dez qubits integrados a fótons, consolidando um avanço essencial rumo à internet quântica. Em paralelo, pesquisas conduzidas pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) evidenciam que o Brasil também acompanha esse movimento, investigando fundamentos e aplicações da comunicação quântica e reforçando o protagonismo nacional nesse campo emergente.

Esse progresso se insere em uma trajetória que remonta à ARPANET, nos anos 1960, e à adoção do TCP/IP em 1983, que estruturou a internet moderna em quatro camadas: enlace, rede, transporte e aplicação. Hoje, a fronteira é a internet quântica, que promete comunicações ultra-seguras, integração de computadores quânticos e medições de precisão inédita, explorando fenômenos como superposição e emaranhamento.

(a) Imagem conceitual. Cada fóton de 854 nm está emaranhado em polarização com um íon ⁴⁰Ca⁺ da mesma cor (a cor indica apenas o emaranhamento). (b) Ampliação mostrando ondas estacionárias de cavidade a vácuo em 854 nm e ângulo de 85,9° em relação à cadeia de íons (linha tracejada). (c) Diagrama de níveis de energia atômica. Fonte: M. Canteri et al.

O salto para essa nova era não é apenas científico, mas também um desafio de engenharia. As comunicações quânticas dependem de uma sólida base em transmissão digital, modulação e codificação, antenas e fibras ópticas, mas exigem igualmente o domínio da física quântica. Compreender a física quântica significa dominar matemática avançada. Sua principal equação, a equação de Schrödinger, é uma equação diferencial parcial que descreve a evolução temporal dos sistemas quânticos. Para tratá-la, são indispensáveis cálculo diferencial e integral, equações diferenciais ordinárias e parciais, análise de variáveis complexas e transformadas integrais, como Fourier e Laplace. A álgebra linear fornece a linguagem dos vetores de estado e operadores em espaços de Hilbert, enquanto probabilidade e estatística são essenciais, já que toda medida em sistemas quânticos é de natureza probabilística. Sem esse alicerce, não é possível compreender os pilares das comunicações quânticas: superposição, emaranhamento e tunelamento.

O Brasil enfrenta ainda um problema estrutural. Precisamos de material humano em quantidade e qualidade. Não adianta quantidade sem qualidade, nem qualidade sem quantidade. O caminho é claro: formar mais engenheiros, e isso passa necessariamente pela melhoria do ensino de matemática no país. Hoje, de cada 100 estudantes que ingressam em cursos de engenharia, apenas 35 concluem a graduação, e somente 15 registram-se no CREA. Apenas esses últimos estão legalmente habilitados para exercer a profissão, já que se trata de uma atividade regulamentada.

Se no passado a engenharia estruturou redes resilientes e levou a internet ao mundo, agora o desafio é preparar o país para a era quântica da conectividade. Isso exige investimentos consistentes em pesquisa e desenvolvimento, formação sólida em ciência e engenharia, e políticas públicas que assegurem tanto escala quanto qualidade. Só assim o Brasil poderá transformar descobertas em soluções concretas para a sociedade.

Fontes
Scientists create scalable quantum node linking light and matter, disponível em https://www.sciencedaily.com/releases/2025/08/250829052210.htm

M. Canteri, Z. X. Koong, J. Bate, A. Winkler, V. Krutyanskiy, and B. P. Lanyon. Photon-Interfaced Ten-Qubit Register of Trapped Ions. Physical Review Letters, 135, 080801 – Publicado em 21 de agosto de 2025

Revista Veja, edição de 18 de agosto de 2025

2025: O Ano da Quântica e o papel do CBPF no Brasil, disponível em: gov.br/cbpf

RFC 791, disponível em: rfc-editor.org/info/rfc791

RFC 793, disponível em: rfc-editor.org/info/rfc793

Telecomunicações: A Engenharia que Transforma Equações em Conexões

Telecomunicações, conforme definido no art. 60 da Lei nº 9.472/1997, a Lei Geral de Telecomunicações, é a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza. Trata-se, portanto, de um campo de complexidade técnica e científica, cujo domínio é atribuído exclusivamente ao engenheiro, em especial ao engenheiro de telecomunicações, ao engenheiro eletricista, ao engenheiro em eletrônica e ao engenheiro de computação, que recebem em sua formação sólida base matemática, física e tecnológica para planejar, projetar e executar sistemas que sustentam a infraestrutura moderna de comunicação.

A engenharia de telecomunicações apoia-se em um tripé conceitual fundamental: a análise espectral, a propagação de ondas eletromagnéticas e a teoria estatística das comunicações. A análise espectral, com base em séries e transformadas de Fourier, possibilita decompor sinais complexos em frequências, permitindo o estudo de interferências, ruídos e ocupação eficiente do espectro. Já o eletromagnetismo, regido pelas equações de Maxwell e desdobrado em análises diferenciais e vetoriais, fornece os fundamentos para compreender como as ondas se propagam em meios diversos, guiadas, refletidas, difratadas ou absorvidas, o que viabiliza desde a transmissão em fibras ópticas até o funcionamento de antenas. A teoria estatística das comunicações, por sua vez, baseada em processos estocásticos, viabiliza a análise de tráfego, do multipercurso, da propagação em canais ruidosos e da taxa de erro de bit, estabelecendo critérios probabilísticos que garantem desempenho e confiabilidade.

Um exemplo emblemático é a fibra óptica, que funciona como um guia de onda. A análise de sua propagação é realizada a partir das equações de Maxwell em coordenadas cilíndricas, permitindo estudar fenômenos como a dispersão intermodal e cromática, que afetam diretamente a qualidade da transmissão. Esse nível de análise, abstrato e matematicamente sofisticado, é indispensável para garantir redes de alta capacidade e baixa perda.

O mesmo ocorre com as antenas: a partir do cálculo dos campos elétrico e magnético é possível determinar o diagrama de radiação, a diretividade e o ganho. Esses elementos são indispensáveis para o correto dimensionamento de sistemas de transmissão sem fio, sejam eles de telefonia celular, satélite ou redes de rádio.

No mundo digital, outro eixo fundamental é o estudo da modulação e da codificação de canal. Modulação é o processo pelo qual um sinal de informação é incorporado a uma portadora, possibilitando sua transmissão em determinadas faixas de frequência. Cada técnica de modulação, especialmente as digitais, amplamente utilizadas hoje, apresenta desempenho específico em termos de taxa de transmissão, robustez ao ruído e eficiência espectral. Esse processo é decisivo porque afeta diretamente a taxa de erro de bit e a confiabilidade da comunicação. A codificação de canal complementa esse mecanismo ao introduzir redundâncias controladas que permitem corrigir erros de transmissão, elevando a eficiência e a qualidade do sistema.

Outro aspecto essencial para redes de comunicação móvel é o cálculo da probabilidade de cobertura (CAP), que utiliza modelos probabilísticos para definir a área efetiva de alcance de um sistema de telecomunicações. Esse cálculo é indispensável, por exemplo, para dimensionar a cobertura de estações rádio-base de telefonia celular em cenários complexos, como áreas urbanas densas ou situações de mobilidade, como embarcações em alto-mar. O engenheiro precisa dominar estatística, teoria da propagação e ferramentas de simulação para oferecer soluções que garantam qualidade de serviço e minimizem zonas de sombra.

Vale destacar que a atuação do engenheiro não se limita ao espectro ou às antenas, mas também envolve a infraestrutura física. Esses profissionais estudam instalações elétricas, cabeamentos estruturados, sistemas de proteção, aterramento e toda a base que garante a segurança e a confiabilidade de centrais e estações de telecomunicações. Além disso, são formados para compreender e projetar protocolos de comunicação, que estruturam as redes digitais modernas. Protocolos de enlace, mecanismos de controle de tráfego, modulação, multiplexação e detecção de erros fazem parte desse arcabouço de conhecimento, essencial para que a informação percorra o caminho correto, no tempo adequado e com mínima perda.

Por isso, apenas o engenheiro de telecomunicações, o engenheiro eletricista, o engenheiro em eletrônica e o engenheiro de computação, pela sua formação específica, estão habilitados para o planejamento, estudo, projeto e execução, a fim de garantir a confiabilidade das redes de telecomunicações.

Em suma, não existe tecnologia sem engenharia, e não existe engenharia sem matemática. O reflexo do atraso do Brasil nesse setor encontra-se no baixo desempenho em matemática, evidenciado pelo PISA de 2022, no qual o país ocupa a 65ª posição entre 81 nações avaliadas, resultado incompatível com seu status de 9ª maior economia mundial em 2023. A consequência direta é a evasão universitária: de cada 100 estudantes que ingressam nos cursos de engenharia, apenas 35 se formam, o que representa a maior taxa de evasão entre todos os cursos do país. “A maioria dos estudantes desiste”, afirmou o presidente do CONFEA em entrevista à Revista Veja. Desse grupo, apenas 15 registram-se no CREA, tornando-se efetivamente profissionais habilitados. Soma-se a isso o tempo médio de formação, que deveria ser de 5 anos, mas no Brasil alcança 6 anos, revelando as dificuldades adicionais enfrentadas pelos estudantes. Muitos ainda migram para outras áreas, como o mercado financeiro, que valoriza a sólida formação matemática dos engenheiros.

É uma feliz coincidência que o atual presidente do CONFEA, Vinícius Marchese, seja engenheiro de telecomunicações, o primeiro dessa modalidade a ocupar a presidência do Conselho. Esse fato é simbólico e reforça o papel estratégico das telecomunicações no desenvolvimento nacional, lembrando à sociedade que a base de todo avanço tecnológico está nas equações, nos cálculos e no rigor científico que apenas a engenharia pode oferecer.

 

Por
Eng. Eletric. Rogerio Moreira Lima Silva
Diretor Estadual e de Inovação da ABTELECOM
Especial da ABEE Nacional
Diretor de Relações Institucionais da AMC
Coordenador da CAPA e da CEALOS do CREA-MA
Professor do PECS/UEMA

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Brasil endurece regras e penas para conter o avanço do crime organizado nos provedores de internet

brasil cria novas regras anti pirataria

Por Eng. Eletric. Rogerio Moreira Lima Silva – Diretor de Inovação e Estadual MA da ABTELECOM, Coordenador da C.A.P.A. e C.E.A.L.O.S. do CREA-MA, Especialista da ABEE Nacional, 1º Secretário da ABEE-MA, Professor da UEMA, Diretor de Relações Institucionais e membro titular da cadeira nº 54 da Academia Maranhense de Ciências; e Adv. José Alberto Lucas Medeiros Guimarães – Mestre em Direito e Instituições do Sistema de Justiça.

Em 2025, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) promoveu um avanço regulatório significativo no setor de telecomunicações ao publicar três normas fundamentais: a Resolução Interna nº 428, de 28 de abril; a Resolução Interna nº 449, de 27 de junho; e a Resolução nº 780, de 1º de agosto.

A Resolução nº 428/2025 estabelece critérios mais rigorosos para comprovação de capacidade técnica e operacional na prestação de serviços de telecomunicações, exigindo que, a cada dois anos, as empresas apresentem documentação sobre programas de Gerenciamento de Riscos (PGR), Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual e Coletiva (EPIs e EPCs) e capacitação de trabalhadores conforme as Normas Regulamentadoras (NRs). Determina ainda a apresentação do Atestado de Capacidade Técnica, do Resumo de Relação de Tomador de Obra (RET) e do registro anual no conselho de fiscalização profissional competente.

A Resolução Interna nº 449/2025 reforça o combate à concorrência desleal e à informalidade ao extinguir a dispensa de outorga prevista na Resolução nº 614/2013 para prestadoras de pequeno porte com até 5 mil acessos, obrigando a regularização de todas as empresas de Serviço de Comunicação Multimídia (SCM) junto à Anatel.

A Resolução nº 780/2025 constitui instrumento estratégico de proteção à infraestrutura crítica de telecomunicações, estabelecendo a obrigatoriedade de certificação prévia para data centers integrantes dessas redes. Essa certificação contemplará requisitos como operação ininterrupta, segurança física e cibernética robusta, eficiência energética e conformidade ambiental. Após a publicação do procedimento operacional, prevista para ocorrer em até 240 dias, novos data centers somente poderão ser instalados ou contratados mediante documento de conformidade emitido pela Anatel, e os já existentes terão prazo de três anos para adequação.

O conjunto dessas três resoluções, nº 428, nº 449 e nº 780, todas de 2025, representa um marco regulatório orientado à prevenção de acidentes e ao bloqueio da infiltração do crime organizado no setor de telecomunicações, assegurando isonomia regulatória, reforçando a responsabilidade técnica e coibindo redes clandestinas, fraudes e furtos de sinal. Essas práticas, segundo investigações jornalísticas e policiais, vêm sendo exploradas por facções criminosas. A gravidade do problema é evidenciada por operações como a da Polícia Civil no Rio de Janeiro, contra provedores de internet controlados pelo tráfico, e pela prisão, no Ceará, de 19 integrantes de facção que administravam provedores ilegais.

Nesse contexto, além das medidas adotadas pela Anatel, o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (CONFEA) vem, desde 2021, executando ações próprias de fiscalização, a partir da aprovação da Decisão Plenária nº 1.744/2021, que instituiu a Fiscalização Nacional dos Provedores de Internet. Essas iniciativas têm por objetivo assegurar a segurança técnica, a regularidade na prestação dos serviços e a proteção da sociedade.

De acordo com o Anuário Estatístico de Acidentes de Origem Elétrica da ABRACOPEL (2025, ano-base 2024), o número de mortes por choque elétrico entre trabalhadores de telecomunicações cresceu 525% entre 2015 e 2023, posicionando a categoria entre os cinco grupos profissionais com maior número de fatalidades. A intensificação da fiscalização pelo CONFEA apresentou resultados concretos: em 2024, o índice caiu para 200% acima dos níveis de 2015, após anos de crescimento contínuo, de 225% em 2021, 275% em 2022 e 525% em 2023.

Além do arcabouço normativo e penal, é fundamental reconhecer que a prestação segura e eficiente de serviços de telecomunicações exige conhecimento técnico especializado, uma vez que a implantação de redes do setor envolve planejamento, estudo, projeto, análise, execução, direção e fiscalização de obras e serviços de telecomunicações. Essas atividades constituem competências e atribuições exclusivas dos engenheiros eletricistas, engenheiros em eletrônica, engenheiros de telecomunicações e engenheiros de computação, conforme os artigos 1º, alínea b, 7º e 27, alínea f, da Lei Federal nº 5.194/1966, o artigo 9º da Resolução CONFEA nº 218/1973 e o artigo 1º da Resolução CONFEA nº 380/1993.

Trata-se de um campo estruturado sobre o tripé formado pela análise espectral, pelo eletromagnetismo e pela teoria estatística das comunicações.

A análise espectral, fundamentada em ferramentas como a transformada de Fourier, é indispensável para identificar, classificar e mitigar interferências, assegurando a integridade dos sinais transmitidos. No contexto das telecomunicações, isso abrange não apenas o espectro radioelétrico, mas também as janelas de transmissão em sistemas ópticos, bem como as diferentes faixas de frequência utilizadas em diversos meios físicos, como cabos coaxiais. A natureza das telecomunicações envolve a transmissão de sinais em múltiplas faixas de frequência, o que pode originar interferências que precisam ser cuidadosamente gerenciadas. Esse controle é essencial para garantir que a transmissão, independentemente do meio ou da tecnologia empregada, mantenha qualidade e desempenho adequados.

O eletromagnetismo, por sua vez, abrange o estudo e o controle dos fenômenos de propagação de ondas eletromagnéticas, considerando aspectos como atenuação, reflexão, refração e difração, elementos essenciais para garantir que o sinal chegue ao destino com a intensidade e a estabilidade adequadas. Já a teoria estatística das comunicações, apoiada no estudo de processos estocásticos, orienta a modelagem, a previsão e a otimização do tráfego, bem como a análise de parâmetros críticos, como a taxa de erro de bits (BER). Não basta que o sinal esteja presente: é imprescindível que apresente qualidade, e a BER adequada é o parâmetro que assegura essa qualidade.

Essa base conceitual e prática, inerente à formação e à atuação do engenheiro, é o que permite projetar, operar e manter redes com alta confiabilidade, evitando falhas sistêmicas e garantindo que a infraestrutura de telecomunicações atenda aos mais elevados padrões de desempenho e segurança. Tais competências não são acessórias; constituem requisito essencial para o exercício da responsabilidade técnica prevista em lei.

O fortalecimento do arcabouço legal é ampliado pela Lei nº 15.181, de 28 de julho de 2025, que aumenta as penas para os crimes de roubo e furto de cabos de telecomunicações e de energia, podendo chegar a 15 anos de prisão. A norma prevê agravantes para delitos que atinjam a infraestrutura de serviços essenciais e estabelece penalidades específicas para empresas que adquiram, comercializem ou utilizem material furtado ou roubado.

Essas mudanças evidenciam um alinhamento entre regulação, fiscalização e legislação penal, voltado a enfrentar riscos e coibir crimes que ameaçam a integridade das telecomunicações no Brasil. O conjunto dessas ações fortalece a proteção da infraestrutura crítica e assegura a oferta de serviços seguros e confiáveis à sociedade, reafirmando o compromisso das instituições envolvidas com a segurança, a qualidade e a continuidade das telecomunicações no país.

Referências:

ANUÁRIO ESTATÍSTICO ABRACOPEL – Acidentes de Origem Elétrica 2025 (Ano-base 2024)

Lei nº 5.194/1966

Resolução CONFEA nº 218/1973

Resolução CONFEA nº 380/1993

Resolução Anatel nº 614/2013

Resolução Interna Anatel nº 449/2025

Resolução Interna Anatel nº 428/2025

Resolução Anatel nº 780/2025

Resolução Anatel nº 477/2007

Lei nº 9.472/1997

Lei nº 15.181/2025

Sinal de internet era fornecido clandestinamente no estado do Rio, Agência Brasil

Homem morre eletrocutado na cidade de Santa Inês, TV Mirante / Globoplay

Decisão nº 60/2022-C.E.E.E./CREA-MA

Relatório Anual de Gestão 2024 – ANATEL

Decisão nº 354/2020-C.E.E.E./CREA-MA

Facções expulsam provedores e dominam serviço de internet em bairros pelo Brasil. G1, 13/04/2025. Disponível em: https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2025/04/13/faccoes-criminosas-expulsam-provedores-de-internet-para-dominar-servico-em-varios-bairros.ghtml

Mapeamento identifica que 80% das empresas de internet em comunidades do RJ são controladas pelo crime organizado. G1, 11/07/2025. Disponível em: https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2025/07/11/mapeamento-identifica-que-80percent-das-empresas-de-internet-em-comunidades-do-rj-sao-controladas-pelo-crime-organizado.ghtml

Polícia prende 19 membros de facção donos de provedores ilegais de internet em Fortaleza. Disponível em: https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2025/06/17/policia-prende-18-membros-de-faccao-que-atacou-empresas-de-internet-no-ceara.ghtml

Polícia Civil faz operação contra provedores de internet do tráfico no RJ. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/sudeste/rj/policia-civil-faz-operacao-contra-provedores-de-internet-do-trafico-no-rj/

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ANATEL fecha o cerco ao crime: nova resolução exige homologação obrigatória de Data Centers

A Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) aprovou nesta sexta-feira, 1º, uma nova versão do Regulamento de Avaliação da Conformidade e de Homologação de Produtos para Telecomunicações. Com a publicação da Resolução ANATEL nº 780, de 1º de agosto de 2025, o Brasil dá um passo decisivo no enfrentamento às vulnerabilidades digitais e à crescente ameaça do crime cibernético. A medida acrescenta ao regulamento um novo título, denominado TÍTULO VI-A – Da Avaliação da Conformidade de Datacenters que Integram as Redes de Telecomunicações, instituindo um marco regulatório inédito e robusto para o controle técnico de uma das infraestruturas mais sensíveis das redes, os datacenters.

A exigência de conformidade e homologação dos datacenters por parte da ANATEL reforça a importância da regulamentação para garantir a segurança e a confiabilidade das infraestruturas críticas de comunicação no país. Esses datacenters integram as redes de telecomunicações e, conforme disposição deste Título, devem atender a rigorosos requisitos técnicos para sua operação.

Para compreender a importância dessa medida, é fundamental entender o que é um datacenter. Trata-se de uma instalação física que abriga sistemas computacionais, equipamentos, aparelhos, dispositivos e demais meios necessários à realização do processamento, armazenamento, gerenciamento e comunicação dos dados. Contudo, dados isolados não têm valor sem o acesso a eles. Por isso, o datacenter é uma estação de telecomunicações, pois não basta a informação, é preciso prover o acesso a essa informação. Esse acesso ocorre justamente por meio da infraestrutura de telecomunicações, que inclui os equipamentos e dispositivos que compõem o próprio datacenter, permitindo a comunicação, o processamento e a disponibilização segura dos dados. Essa definição encontra respaldo legal no artigo 60 da Lei nº 9.472, de 1997, conhecida como Lei Geral de Telecomunicações (LGT), que dá respaldo a definir o datacenter como uma estação de telecomunicações. Diante disso, a regulamentação da ANATEL torna-se essencial para assegurar que essas estações operem dentro de padrões técnicos e de segurança que protejam tanto os dados quanto a continuidade dos serviços.

A ANATEL reconhece, com essa iniciativa, que os datacenters são parte estratégica do ecossistema de telecomunicações e, portanto, não podem mais operar à margem de mecanismos de fiscalização técnica. A partir da publicação do procedimento operacional, que deve ocorrer em até 240 dias, será obrigatória a homologação prévia de qualquer novo datacenter vinculado às redes de telecomunicações, como condição para sua contratação ou ativação por prestadoras de serviços.

Os critérios exigidos pela ANATEL para a homologação desses datacenters são rigorosos e refletem uma preocupação ampla com resiliência, segurança e sustentabilidade. Os centros de dados deverão garantir operação contínua mesmo em situações de falhas, eventos adversos ou desastres, dispor de segurança física reforçada para prevenir acessos não autorizados, contar com proteção cibernética robusta contra-ataques e invasões, utilizar práticas e tecnologias que promovam a eficiência energética e atuar em conformidade com as melhores práticas ambientais.

As operadoras de telecomunicações somente poderão contratar ou instalar datacenters que tenham sido avaliados e homologados nos termos da nova resolução. Já os datacenters atualmente em operação terão um prazo de três anos para se adaptar, o que demandará investimentos e atualizações relevantes em suas estruturas físicas, lógicas e operacionais. O procedimento operacional a ser publicado também indicará como será feito o reconhecimento dos Organismos de Certificação Designados e dos laboratórios de ensaio habilitados, que serão responsáveis por realizar a avaliação da conformidade. A superintendência da ANATEL poderá, inclusive, expedir regras complementares para disciplinar essa atuação, garantindo a imparcialidade e a competência técnica dos entes envolvidos.

Com essa medida, que se soma às Resoluções Internas ANATEL nº 428, de 28 de abril de 2025, e nº 449, de 27 de junho de 2025, a agência reafirma seu compromisso com a segurança como fundamento indispensável para a qualidade dos serviços de telecomunicações. Ao exigir padrões rigorosos para os datacenters que integram as redes, a ANATEL reconhece que não existe qualidade sem segurança, fortalecendo o papel do regulador como guardião da confiabilidade, da continuidade e da proteção das comunicações no país.

Essas ações, junto com a fiscalização nacional dos provedores de internet prevista na Decisão Plenária CONFEA nº 1744/2021, intensificam o controle sobre os sistemas de telecomunicações como forma de garantia e proteção da sociedade, e para coibir a infiltração do crime organizado. O Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (CONFEA) foi pioneiro em ações de fiscalização nacional do exercício profissional em telecomunicações, promovendo a regularidade técnica. Essa atuação pioneira reforça o compromisso das entidades reguladoras e fiscalizadoras em assegurar que as redes de telecomunicações operem dentro dos padrões exigidos, protegendo tanto os usuários quanto a integridade da infraestrutura nacional.

Diversas reportagens vêm denunciando o domínio territorial das facções criminosas sobre o serviço de internet. O Fantástico, da TV Globo, revelou que “o crime organizado está ameaçando o serviço de internet em várias partes do Brasil” (G1, 2023). Em reportagem do G1 Rio, destaca-se que “mapeamento identifica que 80% das empresas de internet em comunidades do RJ são controladas pelo crime organizado”. O portal Minha Operadora publicou a manchete: “Anatel endurece regras e mira facções: 912 provedores de internet podem ser suspensos”. Em nível internacional, o Conselho Internacional de Controle de Narcóticos alertou para o crescimento do tráfico de drogas online, conforme publicado no portal das Nações Unidas.

Ao submeter os datacenters a um processo obrigatório de homologação, a ANATEL eleva o padrão de governança digital no Brasil e amplia o cerco ao uso indevido dessas infraestruturas por organizações criminosas, operadores negligentes ou agentes maliciosos. Trata-se de uma resposta concreta às ameaças que crescem em velocidade proporcional ao avanço da digitalização dos serviços públicos e privados. Em um contexto de ataques cibernéticos cada vez mais sofisticados, a decisão da ANATEL reforça o compromisso institucional com a segurança das redes, a integridade das comunicações e a proteção dos dados.

Mais do que uma medida regulatória, a Resolução ANATEL nº 780 simboliza uma mudança de postura. Os datacenters deixam de ser tratados como meras estruturas de armazenamento e passam a ser reconhecidos como ativos críticos à soberania tecnológica e à segurança nacional. O que está em jogo não é apenas a conformidade técnica de equipamentos e ambientes, mas a própria capacidade do Brasil de proteger sua infraestrutura digital estratégica em um cenário global cada vez mais incerto e interconectado.

 

 

 

Eng. Eletric. Rogerio Moreira Lima Silva, Mestre (IME) e Doutor (PUC-Rio) em Engenharia Elétrica/ Telecomunicações

Diretor de Inovação da ABTELECOM, professor do PECS/UEMA e membro do CREA-MA, ABEE Nacional, ABEE-MA e AMC

A engenharia brasileira desce ao nível quântico

Eng. Eletric. Rogerio Moreira Lima Silva
Diretor Estadual MA e de Inovação da ABTELECOM, professor da UEMA e membro do CREA-MA, ABEE Nacional, ABEE-MA e AMC

 

O anúncio da criação do primeiro laboratório brasileiro especializado em computação quântica, com foco na produção de chips, no estado do Rio de Janeiro, representa um avanço extraordinário para a ciência e a engenharia nacionais. Essa iniciativa posiciona o Brasil no mapa global das tecnologias emergentes, sinalizando a maturidade e a capacidade da engenharia brasileira para enfrentar os desafios da nova fronteira da informação.

É fundamental destacar que a produção de chips é uma atividade intrinsecamente ligada à engenharia eletrônica, em especial à microeletrônica, ramo responsável pelo desenvolvimento, fabricação e integração de circuitos eletrônicos em escala microscópica. O exercício profissional das áreas de eletrônica e telecomunicações é atribuição legal da engenharia, conforme estabelecido nos artigos 1º, 7º e 27, alínea “f”, da Lei Federal nº 5.194/1966, que regula o exercício das profissões de engenheiro e engenheiro-agrônomo. Também são disciplinadas pelo artigo 9º da Resolução CONFEA nº 218/1973 e pelo artigo 1º da Resolução CONFEA nº 380/1993, que definem as competências dos engenheiros eletricistas, engenheiros em eletrônica, engenheiros de telecomunicações e engenheiros de computação.

Portanto, não há como dissociar esse novo marco da computação quântica da atuação plena e legítima desses profissionais no desenvolvimento, implantação e manutenção dessas tecnologias. Afinal, não existe computação quântica sem hardware, microeletrônica e engenharia eletrônica.

Além da computação quântica, a comunicação quântica surge como uma tecnologia revolucionária que utiliza os princípios da mecânica quântica para garantir a transmissão de informações com segurança absoluta, por meio do fenômeno do entrelaçamento quântico e da criptografia quântica. Essa nova forma de comunicação promete transformar a segurança das redes de telecomunicações, tornando-as imunes a interceptações e ataques cibernéticos tradicionais, o que terá impacto direto em setores estratégicos como defesa, finanças, saúde e governo.

O domínio e a implementação dessas tecnologias dependem integralmente do trabalho qualificado dos engenheiros eletrônicos, de telecomunicações e de computação, que serão responsáveis pela pesquisa, desenvolvimento, integração e manutenção dos sistemas quânticos no país.

A computação e a comunicação quântica são, assim, pilares fundamentais para a soberania científica e tecnológica do Brasil, capazes de alavancar nossa posição no cenário global de inovação e segurança. A Associação Brasileira de Telecomunicações (ABTELECOM) celebra esse avanço como uma conquista da engenharia nacional.

Fonte: Laboratório de computação quântica vai produzir chips no Rio de Janeiro, unidade é a primeira do país especializada na área. Convergência Digital. Disponível em: https://convergenciadigital.com.br/governo/laboratorio-de-computacao-quantica-vai-produzir-chips-no-rio-de-janeiro/

Engenharia em Primeiro Lugar: ANATEL Avança com Responsabilidade na Formalização das PPPs

anatel telecomunicacoes

O Anuário Estatístico ABRACOPEL – Acidentes de Origem Elétrica 2025 (ano-base 2024) traz dados alarmantes para o setor de telecomunicações em 2023: o número de sinistros fatais registrados na rede de distribuição elétrica envolvendo trabalhadores de telecomunicações (internet, TV a cabo e telefonia) apresentou um aumento de 525% em relação aos índices de 2015, revelando um quadro crítico de insegurança, já que os profissionais de telecomunicações fazem parte do TOP FIVE dos grupos com maior número de mortes por choque elétrico. Nesse contexto, destaca-se a aprovação da Fiscalização Nacional dos Provedores de Internet, estabelecida por meio da Decisão Plenária nº 1744/2021 do CONFEA, que intensificou a exigência de Anotações de Responsabilidade Técnica (ARTs) e o combate ao exercício ilegal da profissão nos serviços executados pelas prestadoras de serviços de telecomunicações, a qual apresenta resultados impressionantes, pois em 2024 esse percentual já caiu para 200% em comparação com 2015, representando uma queda abrupta no número de mortes.

 

A medida cautelar  da ANATEL para suspensão da dispensa de outorga para o SCM, fixando prazo de 120 dias para que todas as prestadoras realizem os procedimentos para obtenção de autorização de serviço ante a Anatel [5], junto com o Plano de Ação para combate à concorrência desleal para prestação do serviço de banda larga fixa aprovado pela Resolução Interna Anatel nº 449/2025 [8], são medidas importantes em um momento em que temos redes compartilhadas desorganizadas, furtos de sinal e fornecimento clandestino de conexão à internet por organizações criminosas. Ressalta-se que a dispensa de outorga para prestadoras de Pequeno Porte (PPPs) com até 5 mil acessos, conforme disposto na Resolução ANATEL nº 614/2013, já cumpriu seu papel, tendo em vista que o acesso à internet no Brasil alcançou mais de 80% da população [12]. Dessa forma, a exigência da outorga para todos os provedores reforça a necessidade de isonomia, segurança e regulação adequada para o setor.

Importante ressaltar que o setor de telecomunicações é extremamente estratégico para um país, envolvendo também questões que impactam na segurança nacional. O setor de telecomunicações exerce um papel estratégico na segurança nacional de qualquer país, sendo considerado uma infraestrutura crítica que sustenta não apenas a comunicação entre cidadãos e instituições, mas também os sistemas de defesa, inteligência, finanças, energia e saúde. O impacto direto nas capacidades de resposta a ameaças, na soberania digital e na proteção de dados sensíveis é imenso.

O setor de telecomunicações deixou de ser apenas um vetor de desenvolvimento econômico e passou a ser um pilar da segurança nacional moderna. Sua proteção, regulamentação técnica e fortalecimento com base em profissionais especializados, como engenheiros eletricistas, em eletrônica, de computação e de telecomunicações, são essenciais para garantir a soberania, a resiliência e a autonomia estratégica do país através da responsabilidade técnica conforme determinam os arts. 1º ‘b’, 7º e 27 ‘f’ da Lei 5.194/1966, art. 60 da Lei 9.472/1997, art. 1º da Lei 6.496/1977, art. 9º da Resolução CONFEA nº 218/1973 e art. 1º da Resolução CONFEA nº 380/1993.

As telecomunicações, dependendo do tipo, uso de meios confinados ou sem fio, envolvem os três tipos ou pelo menos um destes riscos ao trabalhador: eletricidade, trabalho em altura e radiação não-ionizante. As famosas NRs (Normas Regulamentadoras) são elaboradas e periodicamente revisadas pelo Ministério do Trabalho através de suas comissões tripartites compostas por representantes do governo, empresas e trabalhadores, e para a área de telecomunicações destacam-se: NR-10 – Segurança em Instalações e Serviços de Eletricidade; NR-15 – Anexo 7 – Radiações Não-Ionizantes; NR-16 – Anexo 4 – Atividade e Operações Perigosas com Energia Elétrica; NR-21 – Trabalho a Céu Aberto; NR-33 – Segurança e Saúde nos Espaços Confinados; e NR-35 – Trabalho em Altura.

Desde a fabricação dos equipamentos de telecomunicações ao seu uso nos sites e datacenters das operadoras e provedores de internet, passam por atividades de projeto, execução e manutenção tanto destes quanto de suas instalações, inclusive das instalações elétricas com redundância a fim de garantir comunicação mesmo nas faltas de energia. Lembrando que choques elétricos a partir de 30 mA, ou seja, apenas 0,03A, são suficientes para produzir fibrilação cardíaca, motivo pelo qual a NBR 5410 instituiu a obrigatoriedade do uso de dispositivo diferencial residual para fugas a partir de 30 mA nas instalações elétricas em baixa tensão em 1997, configurando-se aí um potencial lesivo nessa atividade.

No caso específico do Maranhão, já temos casos de acidentes com vítimas fatais em redes de fibra óptica compartilhadas nos postes da distribuidora de energia, que iniciou uma investigação por determinação da Câmara Especializada de Engenharia Elétrica [13], após fato noticiado pela TV Mirante [10], culminando em um auto de infração por exercício ilegal, sendo este auto julgado e mantido pela Câmara Especializada de Engenharia Elétrica [11], com determinação de comunicação à ANATEL, ANEEL e Ministério Público para as demais cominações legais.

Os sistemas de comunicação sem fio emitem radiação não-ionizante que, embora não se tenha comprovado correlação entre doenças cancerígenas e este tipo de radiação, apresentam efeito térmico, este reconhecido tanto por normas quanto por organismos internacionais, como o ICNIRP (Comissão Internacional de Radiação Não Ionizante). No caso do Brasil, a Agência Reguladora dos Serviços de Telecomunicações revogou a Resolução nº 303/2002-ANATEL, atualizando-a pela Resolução nº 700/2018-ANATEL, que trata do tema.

Os trabalhadores que fazem manutenção destes sistemas irradiantes devem ter atenção ao uso dos EPIs para mitigar os riscos devido à proximidade dos sistemas irradiantes, pois a EIPR (Potência Efetiva Irradiada), que leva em conta tanto a potência quanto o ganho da antena, expõem os trabalhadores a efeitos nocivos como fotoenvelhecimento, queimaduras, cataratas etc. Embora os riscos sejam mínimos para a população em geral, os trabalhadores ficam muito expostos pela proximidade destes sistemas, expondo-os a níveis altos de potência, e por isso devem ter atenção ao uso dos EPIs.

As ERBs (Estações Radiobase) usadas para cobertura celular pelas operadoras de telecomunicações detentoras da licença do SMP (Serviço Móvel Pessoal) são exemplos de atividades laborais relacionadas ao risco do trabalho em altura. Essas ERBs que usam as macrocélulas em cobertura outdoor geralmente estão, na maioria dos casos, na faixa entre 10m e 50m de altura, expondo com certeza os trabalhadores aos riscos desse tipo de atividade profissional, inclusive as próprias Small Cells, pois operam geralmente entre 6 e 12 metros de altura, dependendo do planejamento que leva em conta aspectos de cobertura e tráfego de dados.

O risco das atividades de telecomunicações com eletricidade, trabalho em altura, espaço confinado, trabalho a céu aberto e exposição à radiação não-ionizante demonstram a real percepção do risco que a atuação de leigos e maus profissionais podem acarretar à sociedade em tais atividades.

Diante do cenário crítico apresentado, fica evidente que o fortalecimento do setor de telecomunicações vai muito além do desenvolvimento tecnológico e econômico; trata-se de uma questão de segurança nacional e proteção da vida dos trabalhadores envolvidos. A atuação responsável, técnica e qualificada, com respaldo legal e fiscalização rigorosa, é imprescindível para reduzir os riscos e garantir a continuidade dos serviços essenciais que sustentam a sociedade moderna.

Nesse sentido, reforçamos o apoio à decisão da ANATEL de exigir a outorga para provedores com menos de 5 mil assinantes, medida que assegura isonomia e tratamento igualitário, promovendo um ambiente mais seguro e regulado para todos os agentes do setor. Investir em capacitação profissional, cumprimento das normas regulamentadoras e rigor na supervisão é investir na soberania, na resiliência e no futuro do país.

 

Eng. Eletric. Rogerio Moreira Lima, Mestre (IME) e Doutor (PUC-Rio) em Engenharia Elétrica/ Telecomunicações
Diretor de Inovação da ABTELECOM, professor da UEMA e membro do CREA-MA, ABEE Nacional, ABEE-MA e AMC

 

 

Fonte:

[1] ANUÁRIO ESTATÍSTICO ABRACOPEL ACIDENTES DE ORIGEM ELÉTRICA 2025 Ano base 2024

[2] Lei nº 5.194/1966

[3] Resolução CONFEA nº 218/1973

[4] Resolução CONFEA nº 380/1993

[5] Anatel aprova Plano de Ação para Combate à Concorrência Desleal e Regularização da Banda Larga Fixa, disponível em https://www.gov.br/anatel/pt-br/assuntos/noticias/anatel-aprova-plano-de-acao-para-combate-a-concorrencia-desleal-e-regularizacao-da-banda-larga-fixa

[6] Resolução Interna Anatel nº 449/2025

[7] Resolução Interna Anatel nº 614/2013

[8] Lei nº 9.472/1997

[9] Sinal de internet era fornecido clandestinamente no estado do Rio, disponível em https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2025-03/Sinal-de-internet-era-fornecido-clandestinamente-no-estado-do-Rio

[10] Homem morre eletrocutado na cidade de Santa Inês. JM 2ª Edição, disponível em https://globoplay.globo.com/v/8910897/

[11] Decisão nº 60/2022-C.E.E.E./CREA-MA

[12] Relatório Anual de Gestão 2024. ANATEL

[13] Decisão nº 354/2020-C.E.E.E./CREA-MA