5G não é 5GHz
Por Eng. Eletric. Rogério Moreira Lima
Diretor de Inovação da ABTELECOM
Especialista da ABEE Nacional
1° Secretário da ABEE-MA
Diretor de Relações Institucionais da AMC
Coordenador da CAPA e da CEALOS do CREA-MA
Professor da UEMA
A história das telecomunicações móveis é marcada por marcos tecnológicos e também por confusões conceituais recorrentes. Uma das mais atuais é a confusão entre o 5G, quinta geração da telefonia móvel, e o 5 GHz, uma faixa de frequência usada em redes Wi-Fi. Embora compartilhem um número e a letra “G”, essas duas expressões dizem respeito a coisas absolutamente distintas — tanto do ponto de vista da engenharia quanto do regulatório.
A origem das comunicações móveis remonta à década de 1920, com os primeiros sistemas de rádio utilizados pela polícia de Detroit. Esses sistemas tinham como principais limitações a alta potência de transmissão, a ausência de reuso de frequência e a baixa capacidade de atendimento. Foi apenas após a Segunda Guerra Mundial que os avanços tecnológicos oriundos do setor militar passaram a ser aplicados em sistemas civis, impulsionando melhorias em confiabilidade, mobilidade, qualidade e capacidade de comunicação. Pesquisas fundamentais foram realizadas por nomes como Bullington, Young, Egli, Okumura e Hata — este último, ao converter gráficos de propagação em fórmulas matemáticas, viabilizou o dimensionamento de sistemas móveis com o uso de calculadoras portáteis. Atualmente, a engenharia de telecomunicações dispõe de modelos mais robustos e específicos para diferentes cenários, como os modelos alfa, beta e gama, consolidados na Recomendação ITU-R P.1411, que trata da propagação em ambientes urbanos, suburbanos e rurais, inclusive nas frequências milimétricas usadas pelo 5G.
O marco simbólico da telefonia celular ocorreu em 3 de abril de 1973, quando o engenheiro eletricista Martin Cooper realizou a primeira ligação via telefone móvel, consolidando a vitória da Motorola sobre os Bell Labs. A comercialização, contudo, só veio uma década depois, com o lançamento do sistema AMPS nos Estados Unidos. Daí em diante, as gerações da telefonia móvel evoluíram rapidamente: do 1G analógico ao 2G digital, da internet móvel do 3G à convergência de voz, dados e aplicativos no 4G, até chegar ao 5G — voltado à conexão massiva de dispositivos, aplicações em tempo real e comunicação ultra confiável.
Ao longo dessa evolução, não é incomum que conceitos da engenharia tenham sido confundidos com nomes de sistemas comerciais. Um exemplo clássico ocorreu nos anos 1990, quando os termos TDMA (Time Division Multiple Access) e CDMA (Code Division Multiple Access) passaram a ser usados como se fossem nomes dos próprios sistemas celulares. Na verdade, TDMA e CDMA são técnicas de acesso ao meio — no caso, o canal rádio — utilizadas por diferentes padrões. O GSM, padrão amplamente adotado em todo o mundo, utilizava TDMA; o IS-95, popular sob a marca “CDMA”, era baseado na técnica CDMA. Ambas organizam o uso do espectro por múltiplos usuários, mas foram equivocadamente tratadas como sinônimos dos sistemas que as utilizavam, o que levou a confusões mesmo entre profissionais da área.
Hoje, observa-se um fenômeno semelhante com os termos “5G” e “5 GHz”. Equipamentos Wi-Fi que operam na faixa de 5 GHz são, muitas vezes, comercializados como “roteadores 5G”, o que é incorreto do ponto de vista da engenharia e pode induzir o consumidor ao erro. Trata-se apenas de uma rede local sem fio, limitada ao ambiente doméstico ou corporativo, sem qualquer relação com a infraestrutura, os requisitos ou os serviços previstos nos sistemas de telefonia móvel de quinta geração. Já o Wi-Fi de 5 GHz é uma aplicação para redes locais, sem necessidade de licenciamento individual, voltada para pequenos ambientes e com funcionamento muito diferente da telefonia móvel.
O 5G, por sua vez, é uma tecnologia móvel padronizada internacionalmente, cujo serviço no Brasil é regulamentado pela Resolução ANATEL nº 477/2007, que disciplina o Serviço Móvel Pessoal (SMP). Trata-se de um sistema operado em espectro licenciado, com estações radiobase (ERBs), reuso de frequência, obrigações de cobertura, qualidade e continuidade de serviço.
O entendimento claro dessas diferenças é essencial. Não se trata apenas de precisão terminológica, mas de proteção ao consumidor, de segurança regulatória e de valorização da engenharia . O uso incorreto de expressões como “5G” para designar tecnologias que não o são compromete a confiança nas comunicações, gera frustrações no usuário e distorce o mercado.
Portanto, confundir 5G com 5 GHz não é um mero erro de linguagem — é uma distorção que compromete a compreensão do funcionamento das redes, o direito à informação clara e o respeito à engenharia como campo essencial à infraestrutura digital do país. Reforçar que 5G não é 5 GHz é defender a seriedade da comunicação tecnológica e o papel fundamental dos engenheiros no desenvolvimento de soluções confiáveis e eficazes.